Em votação para eleger a mesa do colegiado, governistas foram surpreendidos com a articulação da oposição para driblar escolha do presidente

A base governista no Congresso Nacional sofreu a primeira derrota na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que vai apurar as fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Nesta quarta-feira (20), o senador Carlos Viana (Podemos) foi eleito presidente do colegiado, após articulação da oposição para driblar o senador Omar Aziz (PSD), candidato favorito do governo para assumir o comando dos trabalhos que devem investigar os descontos indevidos em aposentadorias e pensões.
O nome do senador Omar Aziz havia sido indicado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União), para presidir a CPMI. O parlamentar tem um posicionamento alinhado ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e sua indicação para comandar a Comissão era vista como positiva pelo Planalto, já que seria uma forma de frear a ofensiva da oposição na tentativa de culpar a atual gestão pelas fraudes no INSS.
A indicação de Aziz estava pacificada. O comando da CPMI a cargo do senador era visto como concreto e, inclusive, reuniões já eram realizadas nos bastidores para desenhar os próximos passos do colegiado. Entretanto, o nome de Aziz não agradava a oposição, que temia uma interferência do governo no andamento das investigações.
Com isso, parlamentares ligados à direita e centro-direita decidiram lançar candidaturas próprias para a presidência da Comissão, na tentativa de inviabilizar o protagonismo do governo na condução dos trabalhos. Os senadores Carlos Viana e Eduardo Girão (Novo) disputaram o comando da CPMI.
Em dado momento, como forma de unir apoio em torno de um nome, Girão retirou sua candidatura e apoiou Viana. Assim, o senador mineiro foi eleito presidente da Comissão por 17 votos a 14. Essa articulação surpreendeu os integrantes do colegiado, principalmente o governo, que acreditava ser sólida a indicação de Aziz.
Articulação
O deputado Sóstenes Cavalcante (PL), líder do Partido Liberal na Câmara, afirmou que a articulação para derrubar a indicação de Aziz começou na terça-feira (19). Com a iminente instalação da CPMI, agendada para a manhã desta quarta-feira, a oposição decidiu se movimentar para assumir o protagonismo das investigações.
Cavalcante afirmou, em conversas com jornalistas, que conversou com lideranças da oposição, que começaram a angariar apoio para escolher um novo nome para comandar a Comissão. Segundo ele, as articulações nos bastidores se estenderam até as 3 horas desta madrugada.
Após a eleição que concretizou a derrota da base governista, Viana confirmou que conversou com os membros do colegiado e a articulação feita nas últimas 24 horas foi responsável por garantir a vitória da oposição à frente da CPMI. Apesar disso, evitou atribuir uma derrota ao governo.
“Eu não quero falar em derrota de governo. O que eu posso dizer é que quem venceu foi a independência do Parlamento. Nós conversamos, articulamos uma nova possibilidade para a CPMI. Nesses últimos dias conversei com um por um dos representantes e percebi que todos eles tinham o desejo que a CPMI trouxesse respostas. Ontem nós conseguimos o apoio necessário para a vitória, colocamos a candidatura e hoje tivemos os 17 votos que garantem”, disse Viana.
Nesse sentido, Viana afirmou que vai trabalhar para que justiça seja feita e os responsáveis pelas fraudes no INSS sejam devidamente punidos com o rigor da Lei. "Meu compromisso é transparência, responsabilidade e respostas ao povo brasileiro. Chega de esconder debaixo do tapete os escândalos de corrupção", acrescentou o senador.
Relator
A indicação do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos), para a relatoria da CPMI também foi derrotada. O deputado Alfredo Gaspar (União) foi escolhido pelos membros do colegiado para a posição de relator, que é responsável por elaborar o parecer dos trabalhos da Comissão.
Na semana passada, Motta escolheu o deputado Ricardo Ayres (Republicanos) para relatar a CPMI. Geralmente, as indicações feitas pelos presidentes das Casa Legislativas têm força suficiente para se concretizar e, por isso, o nome do parlamentar era visto como certo para assumir a relatoria.
Motta chegou a anunciar a indicação por meio de suas redes sociais, desejando sorte ao deputado e ao senador Omar Aziz, que, até aquela ocasião, era o escolhido para a presidência da CPMI.
Ayres chegou a falar que conduziria “um trabalho técnico, imparcial e transparente”. O deputado também concedeu entrevistas à imprensa, nas quais já era identificado como o relator da CPMI.
Entretanto, após ser eleito presidente da Comissão, Viana rejeitou a indicação de Ayres e escolheu o deputado Alfredo Gaspar para a relatoria. Segundo o senador, a escolha levou em consideração a “experiência curricular” do parlamentar. “O deputado Alfredo é membro do Ministério Público, tem uma larga experiência na investigação e ele sabe da nossa responsabilidade nesse momento, de não ter lado partidário”, declarou.
Gaspar é declaradamente alinhado ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Além das afirmações públicas em defesa do ex-Chefe do Executivo, o deputado foi relator da proposta que suspendeu parte da ação penal em curso no Supremo Tribunal Federal (STF) contra Alexandre Ramagem (PL) por tentativa de golpe de Estado.
Em relação à CPMI, Gaspar garantiu que vai “seguir firme nessa missão” . “Trabalharei em compasso com a verdade e a Constituição, buscando a responsabilização de quem, por ação ou omissão, praticou esse crime gigantesco. O povo brasileiro exige respostas sérias, e nós as daremos”, afirmou.
Já o deputado Ayres disse que encarou “com naturalidade” a escolha de um novo relator. “Com a eleição de um novo presidente, houve a designação de outro relator para o processo. Recebo essa decisão com naturalidade e reafirmo que sigo como membro titular da comissão, mantendo o mesmo compromisso de contribuir com os trabalhos e avançar na investigação das fraudes no INSS, em defesa da sociedade e da boa aplicação dos recursos público” , concluiu.