A equipe econômica do governo federal concedeu uma entrevista na manhã desta quinta-feira (28) para detalhar o pacote de ajuste fiscal feito para equilibrar as contas públicas e cumprir as metas orçamentárias, anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em pronunciamento oficial nesta quarta (27). A expectativa do governo, segundo o ministro, é que a série de medidas gere uma economia de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos e de R$ 327 bilhões até 2030.
Imposto de renda
Na coletiva, Haddad disse que as mudanças na tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) não elevarão os gastos do governo, uma vez que o impacto de R$ 35 bilhões será neutralizado com o aumento da taxação dos que ganham mais de R$ 600 mil por ano.
Nos próximos dias, o governo deve encaminhar ao Congresso Nacional o projeto de Lei que prevê a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil por mês. Caso seja aprovada pelo Congresso, a medida só entra em vigor em 2026.
"O Congresso vai ter o seu tempo agora, sobretudo a partir do semestre que vem, para analisar a proposta do Executivo. Para que tanto a reforma do consumo quanto a reforma do Imposto de Renda entrem em vigor a partir de 1º de janeiro de 2026", explicou Haddad.
"Não queremos confundir o debate da reforma tributária com a questão de medidas que visam reforçar o arcabouço fiscal. A reforma tributária, tanto do consumo quanto da renda, tem um pressuposto que foi anunciado no começo do governo e vai ser mantido se depender do Executivo [...] O pressuposto da neutralidade fiscal. Que significa isso? A reforma tributária não visa nem aumentar, nem diminuir arrecadação. O objetivo da reforma tributária é buscar eficiência e justiça tributária, essa é a finalidade", afirmou Haddad.
"Qualquer aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda, como já foi feito por esse governo duas vezes, tem que vir acompanhado de uma compensação. Não se trata de mexer com o nível de arrecadação de impostos. Trata-se de buscar justiça tributária", completou.
“Vamos supor que a pessoa tenha aluguéis, salário, dividendos, juros. Vai receber sua receita e vai calcular 10% de tudo que recebeu. Vamos supor que tenha renda anual de R$ 600 mil. Vai fazer a conta: eu paguei R$ 60 mil de IR. Não. Paguei R$ 35 mil. Então vou ter que completar com R$ 25 mil. Se pagou R$ 80 mil de IR, não será atingido pela medida”, explicou o ministro.
Taxação dos mais ricos
De acordo com Haddad, a medida de compensação para a arrecadação do governo é sobretaxar quem tem renda superior a R$ 50 mil por mês. Segundo ele, esse tipo de pessoa “pagará um pouco mais”. Ele não deu detalhes de como isso será feito.
Salário mínimo e abono salarial
Haddad esclareceu que o salário mínimo segue com ganho real, mas limitado pelo arcabouço fiscal. Os reajustes reais, a cima da inflação, ficam limitados a 2,5%, mesmo quando o PIB for maior que este limite.
Hoje em dia não há essa limite, atualmente o mínimo é reajustado pela inflação do ano anterior e pela média do PIB dos dois anos anteriores.
O novo pacote também prevê limitar a correção do abono salarial, que será limitado a quem ganha até R$ 2.640, para que ele caia de dois salários mínimos, hoje R$ 2.824, para um salário mínimo e meio.
“Com a valorização real do salário mínimo e o bom ritmo do mercado de trabalho, o abono deixou de ser pago apenas aos trabalhadores que ganham menos”, diz a apresentação do governo.
Em 2025, o ajuste deve promover a economia de R$ 100 milhões, valor que deve se estender a R$ 6,7 bilhões em 2030.
A projeção para o abono salarial considera os seguintes valores anuais:
- 2025: 2,00 salário mínimo
- 2026: 1,95 salário mínimo
- 2027: 1,90 salário mínimo
- 2028: 1,85 salário mínimo
- 2029: 1,80 salário mínimo
- 2030: 1,75 salário mínimo
- 2031: 1,70 salário mínimo
- 2032: 1,65 salário mínimo
- 2033: 1,60 salário mínimo
- 2034: 1,55 salário mínimo
- 2035: 1,5 salário mínimo
BPC
Segundo o ministro, o governo federal promoverá um pente-fino no Benefício de Prestação Continuada (BPC). Com as medidas propostas no pacote de revisão de gastos, o governo federal deve ter uma economia anual de R$ 2 bilhões, R$ 12 bilhões entre 2025 e 2030.
O ministro explicou que a equipe econômica identificou uma “indústria de concessão do BPC”, que faz com que o programa chegue até pessoas que não precisam. “Razão pela qual BPC extrapolou o orçamento este ano em praticamente R$7 bilhões. Precisamos conformar o programa ao texto constitucional. Não há mudança de conceito. Precisamos conter àqueles que são protegidos pelo texto constitucional”, disse o ministro.
De acordo com Haddad, há uma “indústria de liminares” concedidas e o governo estabelece, no pacote fiscal, “critérios legais que dão ao gestor público mais conforto na certeza que o benefício vai chegar a quem realmente precisa e é contemplado pelo texto constitucional”.
“Não se trata de cortar direitos. O presidente [Lula] tem insistido muito nisso. Ele não voltou à Presidência para cortar direitos e não é disso que se trata. Não é disso que se trata. Nós temos que fazer algumas alterações para dar clareza de quem efetivamente tem direito ao BPC no caso da pessoa com deficiência”, completou o ministro.
Para evitar as concessões desnecessárias do programa, o governo federal vai propor uma lei com novas regras de acesso e manutenção na concessão do benefício, semelhantes às do Bolsa Família, exigindo que os beneficiários passem por um cruzamento mensal de dados, além de uma prova de vida anual, reconhecimento facial e biometria.
Militares
O pacote fiscal também inclui ajustes nas contas dos militares. Segundo o ministro, a proposta acaba com a morte ficta, que permite a um militar condenado por um crime ou expulso a receber 100% da pensão como se tivesse morrido.
As reduções nas despesas de militares trarão um impacto de R$ 2 bilhões por ano aos cofres públicos, segundo o ministro da Fazenda. Na coletiva, o ministro agradeceu o empenho da categoria em fazer tais renúncias.
"Foi um gesto significativo e foram coisas que nunca foram conseguidas pelos governos anteriores", afirmou Haddad.
Pé de meia e vale-gás
O ministro também revelou que, a partir de 2026, o Pé de Meia passará a fazer parte do orçamento do Ministério da Educação. Hoje, os recursos para o programa vêm do Fundo de Garantia de Operações (FGO), que está fora das regras do arcabouço fiscal. O programa concede benefícios mensais para estudantes de ensino médio de baixa renda para evitar a evasão escolar.
A equipe econômica também pretende submeter o vale-gás ao arcabouço.
"Vamos apresentar para o relator do vale-gás um substitutivo pactuado com o presidente Lula para mantê-lo dentro do orçamento e do arcabouço fiscal", afirmou Haddad.