O deputado Josimar Maranhãozinho (PL-MA) foi flagrado manuseando uma grande quantidade de dinheiro que, segundo a Polícia Federal, é resultado de um esquema de desvios de recursos de emendas parlamentares.
As imagens, gravadas por uma câmera escondida pelos agentes da PF no escritório do político em São Luís, capital do Maranhão, mostram o deputado retirando as notas de uma caixa e na sequência guardando um maço embaixo da blusa.
Os registros foram feitos em outubro do ano passado com autorização do Supremo Tribunal Federal (STF) e incluídos no âmbito da Operação Descalabro, que apura um complexo esquema de desvio de dinheiro público direcionado pelos deputados para os municípios.
No relatório da PF, obtido pelo Estadão, consta que o fluxo de dinheiro em espécie no escritório do parlamentar tem origem em repasses de empresas ligadas a Maranãozinho, contratadas por prefeituras para executar os serviços a que se destinariam as emendas.
Com ascensão meteórica na política maranhense, Josimar Maranhãozinho tem parentes e pessoas de sua confiança no comando de prefeituras locais.
Nesta semana, endereços do deputado foram alvo de uma operação de busca e apreensão. A PF investiga o desvio de R$ 15 milhões em emendas parlamentares destinados aos municípios de Araguanã, Centro do Guilherme, Zé Doca e Maranhãozinho, cidade da qual Josimar já foi prefeito.
O dinheiro foi repassado às empresas Águia Farma, Medhosp e Atos Engenharia. As três firmas, diz a PF, têm entre seus sócios pessoas que possuem vínculo com o parlamentar. Também são ligadas ao deputado a Construtora Madry Ltda., a Joas Consultoria e Marketing Ltda. e a MG Empreendimentos, que atuam na área de infraestrutura.
Além das imagens, a PF também captou áudios de conversas analisou documentos no escritório que, segundo a investigação, apontam possível ingerência do deputado sobre as prefeituras que recebem suas emendas. Entre os indícios de que ele tinha o controle do que entrava e saía dos cofres municipais estão extratos bancários de prefeituras.
Em relatório do dia 4 de novembro de 2020, a PF afirma que “é possível observar no presente relatório indicativo de cometimento de ilícitos por parte do deputado federal Josimar Cunha Rodrigues (Maranhãozinho) seus funcionários e pessoas sócias de empresas que frequentam o seu escritório”
. “A constatação em vídeo do parlamentar Josimar carregando maços de dinheiro no escritório, somada as conversas degravadas, indica a movimentação de valores à margem do sistema financeiro nacional. Tal constatação causa preocupação e estranheza, especialmente quando o país está às vésperas de uma eleição municipal onde o citado parlamentar aparenta ter grande influência no estado”
, ressalta o relatório da polícia.
Além do desvio de dinheiro, uma das hipóteses é que os recursos estariam sendo utilizados para interferir economicamente na disputa das eleições municipais em São Luís, capital do Estado.
Diante das suspeitas de corrupção, a PF chegou a pedir a prisão cautelar e o afastamento de Josimar Maranhãozinho da Câmara dos Deputados. Mas o relator no STF, ministro Ricardo Lewandowski, não autorizou. Em decisão de 26 de novembro de 2020, Lewandowski anotou que “segundo os elementos informativos apresentados pela autoridade policial, verifica-se a presença de indícios suficientes da constituição de organização voltada, em tese, para promover desvios de recursos públicos federais, especificamente de emendas parlamentares, por meio de interpostas pessoas jurídicas, em favor do Deputado Federal Josimar Cunha Rodrigues, instrumentalizados por contratos fictícios entabulados, sem licitação, com diversos municípios do Estado de Maranhão”
.
Há pelo menos dois inquéritos sigilosos abertos no Supremo para apurar o esquema, batizado de “feirão das emendas” por deputados e assessores. A suspeita é de que parlamentares cobram comissão para indicar recursos do Orçamento a uma determinada prefeitura. O dinheiro seria pago por empresas interessadas nas obras e serviços ou pelo próprio agente público.
A ação da Polícia Federal que teve Maranhãozinho como alvo, na quarta-feira, ocorreu um dia depois de o presidente Jair Bolsonaro se filiar ao partido do deputado, o PL. O parlamentar tem relação próxima com o presidente nacional do partido, Valdemar Costa Neto, condenado pelo esquema do mensalão, quando fazia parte de base aliada do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em outubro, o ministro da Controladoria-Geral da União, Wagner Rosário, admitiu, em audiência na Câmara, “não ter dúvida”
de que há corrupção envolvendo recursos federais indicados por parlamentares via emendas do RP9, popularmente chamado de “Orçamento Secreto“. Ao ser questionado sobre o esquema montado pelo governo de Jair Bolsonaro para aumentar sua base aliada no Congresso, Rosário afirmou que sua pasta e a PF investigavam a venda de emendas e que, “em breve”, deveria haver novidades.
Chamado de “tratoraço” por envolver a compra de tratores, o esquema do orçamento secreto tem ajudado Bolsonaro a manter uma base fiel no Congresso e, com isso, escapar de processos de impeachment. Bilhões de reais foram distribuídos para um grupo de deputados e senadores que determinaram o que fazer com o dinheiro sem qualquer critério técnico ou transparência.
O esquema do orçamento secreto funciona com um conluio entre governo e parlamentares. O Palácio do Planalto escolhe para quem vai liberar dinheiro das chamadas emendas de relator (identificadas pelo código RP-9) e aceita que o parlamentar indique o valor e o que deve ser feito com o montante, incluindo a cidade que irá receber. Em troca, o deputado ou senador favorecido apoia o governo no Congresso.
As reportagens da ISTOÉ e do Estadão procuraram o deputado maranhãozinho e seu advogado, mas ambos não retornaram.